ENCLeuSURADO - Mara Lígia Biancardi

A poesia de Mara Lígia Biancardi, em "ENCLeuSURADOS", tem o confinamento como ponto de partida. Fruto das angústias da autora durante a pandemia da COVID-19, a obra mergulha nas profundezas do detalhe, "do mínimo em matéria de máximo", para fazer emergir dali as imensidões do eu.

Os primeiros poemas não têm tempo (e palavras) a perder: como socos no estômago, corações na boca, buscam extirpar os bacilos do medo e os motes de revolta causados pelo isolamento e devastação do vírus letal. No entanto, a constatação da dor, o dilaceramento da identidade apartada de todo convívio - "parte em partes" - obrigam a poeta a empreender uma jornada de encontro consigo mesma.

E de repente a pergunta: "como posso ser eu?", transforma o percurso poético numa deslumbrante investigação das muitas dimensões que nos compõem, em "aglomerações para inebriar os sentidos". É como se a clausura forçada nos fizesse perceber o quanto já vivemos enclausurados em nossas concepções do que sejamos. A poeta, então, com toda a sensibilidade e força de seus traços vivos, sugere um "abandono às antigas formas de eu" e, na procura por si mesmo, acaba nos encontrando aqui, seus leitores, do outro lado da margem.